quinta-feira, 5 de maio de 2016

O rolo de papel

Venho regularmente ao porto de Leixões desde 2011 e não pude deixar de notar a construção do novo terminal de passageiros.
Fui vendo a obra, fui admirando a obra, fui vendo a placa da obra com o seu custo, fiquei a saber que também seria o Pólo do Mar da universidade e que seria também os futuros escritórios ou instalações da autoridade portuária ou semelhante.
Atraquei algumas vezes nesse terminal, antes da inauguração, servia muito bem de cais de espera.
Com isto tudo fiquei convencido que o terminal antigo iria desaparecer para dar mais espaço ás operações comerciais, como todos nós sabemos o porto de Leixões é exíguo e não tem grande possibilidades de expanção.
Como todo o português sabe ou tem a noção disso, o país está de tanga e um investimento na procura de rendimentos é sempre bem vindo mas.... investir uns 50 a 60 milhões de euros num terminal de passageiros que segundo li num jornal que todo orgulhoso escrevia que Leixões iria receber anualmente cerca de 160 000 passageiros, estou a pôr um número acima pois não me lembro ao certo, mas deu-me para fazer as contas e um grande Cruise Ship leva á vontade 3 000 passageiros o que dá 53,3 navios/ano, um navio por semana.
Depois deste brilhante cálculo fico a pensar. Uma obra daquelas para um navio por semana? Vale a pena? Eu duvido.
E já agora sobre os navios de passageiros actuais que tanto Lisboa e Leixões tentam atrair como se fosse a salvação da economia nacional, se calhar deve ser isso quando os nossos políticos querem referir quando dizem que o nosso futuro é o mar. Um moderno Cruise Ship (vulgo navio de cruzeiro) não passa de um imenso centro comercial flutuante, com lojas, casino, restaurantes e muitas oportunidades de os passageiros gastarem dinheiro, o objectivo deles é fazerem os passageiros gastarem o dinheiro a bordo e não nas cidades dos toscos que fazem obras megalómanas para receber esses navios. Uma notícia recente deu conta que no ano passado tinha havido mais turistas a desembarcar em Lisboa (passageiros) mas que em média tinham gasto menos 54€ (se fizermos as contas aos 160 000 de Leixões são 8,5 milhões a menos.
Gostava de saber qual o preço unitário daquele mosaico octogonal que cobre o rolo de papel. Sim, a obra parece um rolo de papel, sim, é um edifício que estéticamente até gosto mas acho dinheiro a mais para limpar a merda que se faz neste país.
E o terminal antigo continua activo pois parece que um dos barracões antigos aparece num filme todo xpto de um realizador português, desculpem a minha ignorância mas não gosto mesmo do cinema português por isso não sei que filme nem quem o realizou. O que sei é que quando venho a Leixões vejo mais navios no terminal antigo do que no terminal novo.
Nesta minha última estadia estava nessa situação e o terminal novo estava como cais de espera para um cargueiro.




Oh mar salgado, quanto do teu sal são lágrimas de Portugal.... pois, choramos estas caramelices.
Volto a repetir, a obra até que é bonita.

terça-feira, 15 de dezembro de 2015

A viagem

Saímos de Leixões com destino a Ponta Delgada, era nossa viagem de rotina. Íamos tentar chegar no domingo antes das 24:00 para termos entrada e passarmos uma noite descansada em porto.
O tempo trocou-nos as voltas, o mar alterou-se e o navio atrasou para as 02:00 de segunda feira. Nada de especial, o mar até nem estava muito desconfortavel.
Só que para surpresa nossa era esperada uma grande tempestade que iria passar por S.Miguel e eles disseram que não nos queriam no cais pois as vagas de oito metros ultrapassariam a muralha e o navio não se aguentaria ao cais. Treta, eu já lá estive numa tempestade em 2011 e o navio aguentou-se, apenas um necessitou de ajuda pois levou com uns contentores e ía levando com uma grua em cima. O cais estando vazio podiam deixar-nos numa posição, que bem amarrados, nos aguentariamos, o mais que poderiamos ter que fazer seria arrancar com a máquina para aguentar as guinadas.
Mas era mais fácil mandarem-nos para a parte norte da ilha, para ficarmos abrigados pairando. Apanhámos porrada de três em pipa. Ahhhh, e tínhamos um contentor carregado de explosivos á proa.


E assim, nesta posição esperámos até ao pico da tempestade que foi ás 15:00 para nos mandarem embora. Era melhor irmos para a Praia da Vitória pois Ponta Delgada iria ficar fechado muito tempo.
E lá saímos. Apanhando cacetada de criar bicho.

 
Pairando no mau tempo

Mas havia um problema, só poderíamos entrar na Praia da Vitória no dia seguinte ás 10:00, não esquecer que o tempo de viagem normal é de seis horas mas como estávamos a apanhar com o pico da tempestade só conseguimos chegar ás 02:00 o que nos dá uma margem de oito horas de espera. Porreiro pá, vamos ficar a fazer piscinas até ás dez.
Querem saber qual a minha opinião? Deu muito jeito não entrarmos em Ponta Delgada pois assim passaram a tempestade em casa sem nenhum sacana de navio a chatear. Posso estar enganado mas duvido, não se deixa um navio cá fora nestas condições. Bastava ter uma falha de arranque na máquina para ficarmos á beira de uma tragédia.



A caminho da Praia da Vitória

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

O encalhe do tanker em Cascais


Uma pequena reportagem fotográfica do encalhe do Tokyo Spirit na marina de Cascais no dia 17 de Outubro de 2015.

Estava no Jumbo de Cascais quando me chamaram a atenção para o navio que tinha encalhado. Fui a casa pôr rapidamente as compras, munir-me do meu equipamento e correr até á marina de onde tirei estas fotos.

Acho que as imagens falam por si, não são necessários mais palavras.












No dia seguinte foi retirado por sete rebocadores e levado para a Lisnave em Setúbal.

Extracto de Crónicas...1



Vazio de tudo. Não consigo transpor nada embora o meu espirito transborde de emoções, pensamentos e desejos.
Estou novamente embarcado, estou sempre embarcado, morto de inanição, parado no tempo, á espera.
O tempo que escorre lentamente, vão ser mais dois meses, oito semanas de prisão, onde o que acontece é apenas trampa, merda de vida numa merda de um sistema podre que nada serve. Serve para que alguns, julgando-se grandes, actuem com soberba e incompetência. Já não me interessa, sigo a corrente e o que é necessário é chegar.
Lembro-me de uma vez ter dito que nestes sítios só ficavam os pobres de espírito e os que não tinham lugar em mais lado nenhum, ainda não sei qual a minha classificação. Apenas cá continuo sem mais lugar algum que me acolha. Sinto-me a morrer por aqui, a definhar e a morrer, lentamente entrando em degradação. Quando morrer nem necessário será a cremação, a degradação será tão total que só mesmo deitado fora sirvo para alguma coisa.

Extracto de "Crónicas de um tempo"

sexta-feira, 1 de maio de 2015

domingo, 12 de abril de 2015

Action Cam

Jonas! Que fazes? Pergunta Jaime com preocupação vendo o seu colega indo para o convés.
Jonas estava armado de sua "action cam" e dirigia-se para o convés debaixo de uma tempestade brutal, o mar galgava o convés e varria-o de bombordo a estibordo arrastando tudo o que se encontrava solto. Já se tinham perdido vários bidões de óleo que tinham ficado mal estivados, os cabos que os peavam tinham rebentado. O óleo derramado, espalhado no convés agarrava-se pastoso e escorregadio ás chapas do convés esperando que uma vaga mais forte o arrancasse e o levasse para o mar. Pequenas peças de peamento encontravam-se espalhadas ao longo do chão marcando o fluxo da água do mar que tudo arrastava. Era um cenário de destruição a raiar o apocalíptico. O comandante já tinha reduzido a máquina e mudado o rumo para um de mais feição para aguentar a força da tempestade. O silêncio a bordo era sepulcral tal era a preocupação de toda a tripulação, o mar estava mesmo bravo e o navio não era novo.
Apenas Jonas não pensava assim, estava apaixonado pela fotografia e pequenos filmes, pequenas notas dizia ele. E esta tempestade era o momento tão esperado para a poder documentar com imagens. Mal apanhou uma aberta, equipou-se com a sua "action cam" e saltou para o convés para filmar a realidade de uma tempestade. Jonas era uma pessoa impulsiva, reconhecia e media o perigo mas gostava de o desafiar, aborrecia-o apenas o facto de fisicamente não estar nas melhores das formas mas isso não o impedia de seguir em frente com o seu projecto para no fim o exibir como um troféu, exibia-o com um sorriso de criança traquina.
Estava frio, o vento era gelado, carregado de farripas de água cortante, Jonas vestiu uma parka para se proteger, para proteger o peito do frio que se fazia sentir. Começou as descer as escadas que davam acesso ao deck analisando o comportamento da água, o seu objectivo era atingir a área entre os porões e ter acesso aos dois bordos do navio e poder escolher o que fornecesse melhores imagens.
Deu os primeiros passos em corrida e ficou com os pés encharcados, a água corria louca com uns bons centímetros de altura escorrendo pelas aberturas laterais, a água estava a entrar bem pelo lado de estibordo Jonas tinha que se apressar, os corredores laterais eram umas armadilhas mortíferas, numa viagem anterior um homem tinha sido arrastado e só não se perdeu porque conseguiu agarrar-se ao varandim. 
Escolhido o seu posto, uma zona protegida pelos grandes macacos hidráulicos para a abertura dos porões, escolhidos os pontos de apoio para se agarrar em caso de necessidade Jonas começou a filmar. Com grande desgosto o mar pareceu acalmar de repente, a água não subia, as vagas eram ralas, o navio seguia direito e nada acontecia. Jonas foi fazendo pequenas notas de filmagem mas as imagens obtidas eram nada, não conseguiam mostrar a força da tempestade.
O frio e os pés molhados começavam a incomodar mas Jonas não arredava pé quando se apercebe, lá á proa no navio se começa a desenhar uma vaga maior. Preparou a máquina, começou a filmar de imediato, mais tarde poderia cortar o que não interessava. Jonas usava uma haste para segurar a câmera de modo a que ela estivesse no corredor de estibordo mantendo-se abrigado atrás dos macacos. Ia espreitando para ver o andamento do mar quando de repente o navio dá um salto e inclina-se todo a estibordo fazendo com que uma vaga entrasse á proa e começasse a varrer tudo á sua frente. O impacto da água na máquina foi tremendo mas a haste aguentou mas a imagem vacilou ficando tudo submerso. Jonas ficou encharcado, a previdência de ter estado protegido e agarrado fez com que não tivesse saído pelos escoadouros a ré do deck.
Jonas tinha a imagem que queria mas sem baixar a guarda esperou por uma boa aberta e refugiou-se no casario.
Mal viu um membro da tripulação Jonas com um sorriso de menino traquinas foi mostrar o filme da sua última traquinice. Os sons de exclamação do pessoal ao ver as imagens eram música para o seu ego.
Mais tarde foi compor o seu filme e publicá-lo numa rede social. Estas coisas só têm piada quando são mostradas.