Jovem  praticante de maquinista da marinha mercante, jovem inconsciente que  fez o seu primeiro embarque logo como oficial de quarto no navio Cabo  Verde da CNN.
O  Cabo Verde era um navio de 5000 tons com uma máquina MAN de 4050 Hp com  casario a meio navio, tinha dois porões a vante e um a ré do casario.  Tinha ainda um pequeno castelo á popa que era alcunhado de o Tarrafal.  Compreendi o porquê dessa alcunha na primeira vez que lá fui num dia de  mau tempo em que o navio fazia um belo balanço em parafuso.
Já  lá estava há um certo tempo, já era um veterano de 3 ou 4 meses de  embarque e sempre muito voluntarioso. Como pessoa eu era um indivíduo  que não chegava aos 70 kg de magro que era para os meus 1,73 de altura.  Era seco e hoje posso dizê-lo, bem rijo.
Era  o quarto da noite, das 20h ás 24h e estava como o ajudante a desmontar  uma depuradora de fuel para limpeza. Esse trabalho era da  responsabilidade do ajudante mas como eu percebia muito daquilo teimava  sempre em faze-lo, sempre me ajudava a passar o tempo.
Deviam  ser por volta das 22h quando o ajudante foi fazer um coffee break, eu  como oficial e responsável não gostava muito de abandonar a casa da  máquina, fazia-o algumas vezes mas não me sentia muito confortável. E  estando sozinho na casa da máquina achei por bem mudar a taça da  depuradora de um sítio para o outro, a taça é uma peça que pesa uma data  de quilos, é pesada e aquela eu aguentava com ela agachando-me,  agarrando com as mãos e levantando-a com a força das pernas, que foi o  que fiz. Então, uma vez içada á força de músculos a taça resolvi rodar o  corpo para a colocar no sítio desejado. E assim fiz.
Imediatamente  senti um estalo na base das costas, mesmo na parte debaixo da coluna.  Não sei o que me aconteceu, perdi as forças e caí para trás ficando  sentado no chão com as pernas abertas á volta da taça que não me apanhou  uma perna por sorte.
Quis-me  levantar e para minha surpresa as pernas não me obedeceram,  belisquei-as e nada, estava tudo inerte da cintura para baixo.
Fiquei  assim um bocado abananado e então tomei uma decisão, arrastei-me até  uma coluna ali perto e encostei-me a ela, acendi um cigarro e esperei.
Passados  cerca de 10 a 15 minutos apareceu o ajudante que quando me viu  perguntou o que eu estava ali a fazer sentado naquela posição.  Expliquei-lhe muito calmamente a situação e tive que o agarrar  imediatamente porque ele já ia disparado pedir ajuda.
-  Não meu caro, não quero aqui o enfermeiro! Homem com umas capacidades  de enfermagem muito duvidosas. Quero que você me ajude a tratar disto.
- Eu estou aqui agarrado á coluna, você vai-me puxar as pernas até eu dizer. Ao meu sinal dá um esticão. Entendeu?
O ajudante chamou-me uma data de nomes em que o mais simpático foi o de maluco mas eu levei a minha avante.
O  homem começou a traccionar as pernas e eu a fazer força para me manter  na posição, fazer força apenas com os braços até que comecei a sentir  uma leve dor na base das costas.
- Agora! Gritei eu…
Ele deu um esticão e senti logo outro estalo. E vieram as dores juntamente com a sensibilidade das pernas.
Levantei-me,  sorri, acendi outro cigarro, sim na altura eu fumava, e discuti com o  ajudante o que tinha acontecido. Provavelmente com a rotação um nervo  devia ter ficado entalado cortando os circuitos para as pernas. Com  aquele esticão tinha tudo ido ao lugar.
Arrisquei  mas eu sabia que se chamasse por ajuda, só o transporte escadas acima,  escada quase a pique pôr-me-ia num estado ainda mais miserável, o  enfermeiro se fizesse alguma coisa seria m**** com certeza. Ficar  deitado num beliche até chegar a terra que naquele caso seria  Guiné-Bissau. Ser tratado por médicos cubanos ou búlgaros cujas  histórias que ouvíamos eram de arrepiar os cabelos, ser evacuado num  avião para Lisboa. Quando chegasse a um sítio decente arriscava-me a ser  tarde demais. Arrisquei o auto tratamento e ganhei… bem fiquei a andar  mas hoje tenho uma hérnia discal que me dá que fazer.
E continuei a fazer a minha vida normal… no dia seguinte entrei de quarto novamente.
Estava no ano de 1979, ano em que acabei o curso geral de máquinas.
Jimmy
 
Jimmy arranja alguma foto do navio Cabo Verde?
ResponderEliminarObrigado