sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Mulher a bordo

È uma cena singela comum aos navios, o comportamento do marítimo macho perante o aparecimento de uma fêmea…
Nos navios e neste caso num petroleiro o pessoal está normalmente fechado naquela caixa de aço uns bons 5 a 6 meses em média, raramente se vai a terra e alguns como as chefias de topo nunca põem os pezinhos em terra.
Com esta situação de isolamento os arrebiques de decoração masculina são um bocado postos de lado. É comum, especialmente ao almoço ver-se um festival de barbas por fazer, cabelos no ar e até um certo cheiro a suor pois larga-se o trabalho ao meio dia para se ter a refeição ao meio dia e depois voltar-se a regressar aos afazeres novamente ás 13 horas.
Neste navio em questão, o comportamento foi o típico, á hora da refeição lá estava o pessoal todo de t-shirt, calções e sandalocha a tomar as refeições até que recebemos a notícia que o navio iria receber uma praticante de piloto. Um praticante é o equivalente ao estagiário em terra só que neste caso seria uma rapariga em vez do habitual moçoilo que leva com as praxes todas da ordem incluindo uma carecada com fotografia para comprovar que se sofreu as sevícias do pessoal. Este caso era diferente, era uma rapariga que vinha para bordo e aposto que as cabecinhas começaram todas a pensar, e atenção que eu não sou como aqueles que as maluqueiras só são feitas pelos outros, pensei no mesmo também.
E a rapariga chegou ao navio e tenho que reconhecer que era bastante bonita, mesmo dando o desconto de um grande isolamento tenho de reconhecer que a pequena era bonita mas pronto, bom dia, boa tarde e a vida continuou, tentamos não ser muito selvagens.
Á hora da refeição é a altura em que as transformações chegam ao ponto máximo, era um espectáculo. Primeiro, quando entrei quase que caí para trás com o cheiro intenso a uma riquíssima mistura de odores das mais variadas marcas de colónia e after-shave, do mais intenso ao intensíssimo. A seguir, dando uma vista de olhos pelas mesas pude constatar um brilho intenso, as cabeças todas brilhavam de lavado e algumas primavam pela utilização de gel fazendo poupas e outros penteados da moda. As caras dos marujos, normalmente tisnadas e barbudas, naquele dia pareciam rabinhos de bebés tal tinha sido a intensidade da utilização das lâminas de barbear. As sujas t-shirts tinham sido substituídas por camisas floridas de cores garridas e atractivas, todas lavadinhas e passadas a ferro. Os calções normalmente utilizados, aqueles de desporto tinham sido substituídos por jeans das mais variadíssimas marcas e as eternas sandálias e/ou chinelas agora eram brilhantes pares de ténis de boas marcas. Eu também tinha feito a barba e mudado de t-shirt para uma lavada, também sou humano.
E a rapariga entrou naquele ninho de machos que tal como muita passarada tenta apresentar as penas mais brilhantes para atrair a fêmea. E entrou como qualquer praticante, intimidada por um novo mundo, nervosa pois não conhece os comportamentos e está a iniciar uma carreira, a sua última preocupação era arranjar um macho.
E assim decorreu o almoço.
Com o tempo o pessoal começoua habituar-se á presença da rapariga como mais um tripulante e as velhas roupas começaram a aparecer, as barbas outra vez a despontar mas nunca a chegar ao ponto que estava inicialmente antes da chegada da praticante…. É que a esperança é sempre a ultima a morrer….

Publicado no SOL na quinta-feira, 4 de Setembro de 2008 10:45

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Uma gaivota disse: